A política vai decidir
Escantear partidos exclui a própria democracia
Passados três meses da atual gestão, o futuro da economia brasileira e do governo do presidente Jair Bolsonaro (PSL) vão depender, ironicamente, da política.
Tão atacada, foco de protestos da população e alvo preferencial dos candidatados considerados “outsiders” durante o processo eleitoral de 2018, a política volta a ser decisiva para que o governo atinja o sucesso de construir mais uma etapa de fortalecimento da economia brasileira.
As novas votações, que precisam ser viabilizadas no campo da política, darão o escopo e demonstrarão, na prática, qual rumo tomará a economia brasileira, pois, entre a apresentação da proposta e o texto a ser sancionado, há uma longa diferença e caminhos que serão determinados da forma como se dará a condução política.
Durante a campanha, esta mesma política foi demonizada e tachada de velha política. Com base nisso, novos paradigmas surgiram e, portanto, houve uma nova pauta calcada sobretudo nas redes sociais, que fluem como uma mídia social individual e não institucional.
Os partidos tradicionais pagaram um preço, é verdade; mas, passada a tormenta, o que se observa é que, para dar o passo decisivo na evolução do governo Bolsonaro, mais do que nunca se precisa da política.
É a boa política —não estou aqui falando de fisiologismo, negociação de cargos nem liberação de recursos— que vai aprovar a reforma da Previdência sem ter a desidratação que desfigure o avanço do equilíbrio fiscal e, consequentemente, desfaça a sinalização necessária para os preceitos do bom investimento e da segurança jurídica.
A capacidade de pagamento do Brasil e o endividamento público são hoje óbices para uma leitura animadora sobre o futuro do país. A reforma da Previdência, ou a nova Previdência (como quis denominar o governo atual na tentativa de estabelecer uma outra comunicação), por si só não resolve os problemas do governo. Tem o condão, contudo, de avançar a economia e talvez descolar a atividade econômica da própria ação do governo.
Se, durante a campanha, espancar a política serviu como alavanca para catapultar candidaturas e conseguir votos (e realmente aconteceu), na gestão e no dia a dia da governabilidade a política ganha traços de ação prioritária, decisiva e nobre na ótica de quem quer governar com responsabilidade e sem sustos.
Articular uma base sem tratar com os partidos políticos e os líderes partidários —que se sentam à mesa do presidente da Câmara dos Deputados e do Senado Federal para definir a pauta e dar urgência às matérias— é construir uma casa sem alicerces, que ruirá em momentos de tumultos.
Tentar pôr de lado os partidos políticos é uma medida que exclui, na prática, a própria democracia. Isso porque a eleição para o Executivo e para o Legislativo se configura por meio dos próprios partidos políticos, mesmo que muitos precisem ser reformulados —um fato determinante e necessário. Em ambos os casos, a vida partidária precisa ser regada com boas práticas políticas, verdade e respeito.
O governo atual encontra-se em um dilema: continuar no palanque fustigando os partidos e a política ou cair na realidade de que a construção política é algo fundamental e que precisa ser feita com qualidade para que os objetivos se confirmem e sejam atingidos.
O governo Bolsonaro tem um longo caminho a percorrer no sentido de que, ao fazer ajustes aos novos tempos, dependerá também da política como aliada na construção de um país melhor. No final das contas, a política é quem vai decidir.
Romero Jucá
Presidente nacional do MDB, economista e ex-senador por Roraima (1995-2019)
Foto: Pedro Ladeira